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Panorama: O touro está forte, mas o urso ronda

4 de agosto de 2020

31 de julho de 2020

Marco Antônio dos Santos Martins(*)

No mercado ações é tradição associar os movimentos de alta ao touro, com o termo bull market sendo associado aos investidores que estão apostando na alta do mercado. Já o urso está associado aos movimentos de baixa no mercado, com o bear market associado aos investidores que apostam na queda.

A origem dessa história ainda é um tanto quanto incerta, mas ela foi espalhada para o resto do mundo a partir de Wall Street. Dentre as versões, Ivan Sant’anna em seu bestseller “Os Mercadores da Noite1” conta que:

“Quando, em janeiro de 1848, James W. Marshall descobriu ouro na Califórnia, aventureiros de todo o país correram para a região. Um ano depois, os garimpeiros podiam ser contados às dezenas de milhares, acomodados em cidades improvisadas.

Era preciso alguma coisa para divertir aquela multidão de homens rudes. Surgiram, então, as touradas que os mexicanos, vindos do sul, haviam herdado de seus colonizadores espanhóis. Mas a luta entre o homem e o touro não foi suficiente para agradar os garimpeiros. Queriam algo mais violento, menos previsível, uma luta igual em que pudessem apostar. Os touros foram, então, aproveitados para lutar contra ursos, encontrados em abundância no norte do estado.

A nova luta foi um sucesso. Durava apenas alguns minutos. Terminava, invariavelmente, com a morte de um dos participantes. Algumas vezes, o touro, com um rápido movimento da cabeça para cima, perfurava com os chifres o peito do adversário. Em outras, o urso, com uma violenta patada para baixo, esmigalhava o crânio do inimigo. O touro sempre ataca para cima. O urso, para baixo.

Veio dessa época o hábito de chamar de touros as pessoas que apostam nas altas do mercado, pois estão jogando na expectativa de um movimento para cima. Por outro lado, ursos são os que apostam no movimento para baixo.”

Dentro desta linha, quem vai a Wall Street pela primeira vez, não deixa de visitar o Touro de Wall Street (Charging Bull). Uma escultura de bronze situada em Bowling Green, no distrito financeiro de Manhattan, na cidade de Nova Iorque. A obra pesa 3,5 toneladas, mede 3,4 metros de altura e 4,9 metros de comprimento, e foi idealizada pelo artista Arturo di Modica. A escultura representa um touro em posição de ataque e simboliza um mercado financeiro pujante (bull market).

Modica idealizou a estátua após o crash da bolsa de valores de Nova Iorque de 1987, a “segunda-feira negra”, como um presente para a cidade, um “símbolo da força e poder do povo americano”. O artista gastou suas economias, 360 mil dólares, na obra, que foi instalada em 15 de dezembro de 1989 na  Broad Street, em frente ao prédio   da Bolsa de Valores. A escultura foi apreendida pela polícia de Nova Iorque e levada a um pátio de veículos. O protesto público que se seguiu levou o Departamento de Parques  e  Recreação  da  cidade  a  reinstalá-la  dois  quarteirões  ao  sul  da  Bolsa, em Bowling Green, com uma cerimônia em 21 de dezembro de 1989.

Na cotidiana batalha de touros e ursos do mercado de ações, o touro saiu mais uma vez fortalecido no mês de julho, com o IBOVESPA seguindo o comportamento dos demais mercados internacionais e encerrando a última sexta-feira (31) em 102.912 pontos, após ter atingido 105.605 pontos na quarta-feira (29), com uma valorização de 8,27% no mês, sendo o quarto mês seguido de valorização, reduzindo as perdas do ano para 11,01%, voltando aos patamares do final de fevereiro. Além disso, o nível de volatilidade diária voltou aos patamares históricos.

O touro vem se nutrindo com as boas notícias da evolução das pesquisas da vacina, com a reabertura das economias e, principalmente, com a elevada liquidez global. Segundo estimativas do mercado, os Banco Centrais já injetaram um volume de liquidez equivalente a 13% do PIB mundial. Somente o BC americano já liberou um volume de liquidez equivalente a 30% do PIB, lembrando que na crise de 2008 o BC injetou algo em torno de 10% do PIB.

Na história dos mercados, quanto mais fortes ficam os touros, maior é a sede de ataque dos ursos, que, por sua vez, vem se alimentando do aumento das tensões entre Estados Unidos e China, da evolução do quadro eleitoral americano, dos riscos de uma segunda onda da Covid-19, bem como de uma certa dose de frustração com os indicadores econômicos, que voltaram a piorar na economia americana nas últimas semanas, com resultados fracos nos primeiros balanços semestrais que estão sendo divulgados. Nesta semana, por exemplo, foi divulgado que o PIB americano apresentou uma retração de 32,9% no segundo trimestre.

Em termos locais, os ursos são nutridos pelo crescimento do déficit e da dívida pública, pelas dificuldades do governo em evoluir com a pauta de reformas e em construir uma pauta positiva em relação ao meio-ambiente e pelos riscos de novas ondas de crescimento da doença. O Brasil, segundo o boletim das 13h de domingo (2 de agosto) do consórcio de veículos de imprensa, registra 93.659 mortes e 2.711.132 casos, em meio ao movimento de abertura das atividades em diversos grandes centros do país.

Assim, é recomendável acompanhar o comportamento do mercado e não subestimar a força dos ursos, por mais forte que o touro pareça estar.

Finalmente, o dólar PTAX fechou a semana cotado a R$ 5,2033, com uma desvalorização de 4,98% no mês, mas ainda acumulando uma alta de 29,09% no ano, lembrando que a grande maioria das moedas dos demais emergentes apresenta um comportamento melhor, já que nesses países a relação entre taxa de juros local e situação fiscal é mais favorável que a do Brasil.

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1 Sant´anna. Ivan. Os Mercadores da Noite. Rocco. Rio de Janeiro: 1997.

 

(*) Professor do DCCA da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS, Doutor em Administração, com ênfase em Finanças e Mestre em Economia pela UFRGS.