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Panorama: O campeonato mais difícil do mundo

30 de novembro de 2020

29 de novembro de 2020

Marco Antônio dos Santos Martins(*)

O futebol é a paixão nacional. Longe de ser apenas um clichê utilizado no cotidiano, os números do setor ajudam a fundamentar a afirmação. De acordo com o estudo denominado “O impacto do futebol brasileiro1”, elaborado pela CBF em parceria com a Ernst & Young em 2018, foram jogadas mais de 19 mil partidas e 29 mil horas de futebol, com média de 50 jogos por dia em todo o país. Com isso, o futebol brasileiro movimentou um total de R$ 48,8 bilhões, representando 0,72% do PIB brasileiro. No que se refere aos tributos, o futebol representou R$ 761 milhões em arrecadação e gerou mais de 156 mil empregos, que representaram R$ 3,34 bilhões em salários e encargos sociais.

O relatório prossegue destacando que o futebol brasileiro é composto por 360.291 atletas. Deste total, 88 mil são profissionais, o que corresponde a 24,4% do montante, sendo que 11,6 mil tiveram contratos ativos na temporada. Os clubes registrados totalizaram 7.020, sendo que se encontravam em atividade 874 clubes profissionais e 556 amadores, os quais participaram de 250 campeonatos, levando mais de 7 milhões de pessoas aos 798 estádios registrados nas federações de futebol.

Dentre os vários campeonatos disputados no Brasil está o Campeonato Brasileiro de Futebol, também conhecido como Brasileirão Série A, que é a principal competição futebolística no país. É por meio dela que são indicados os representantes brasileiros para a Copa Libertadores da América (juntamente com o campeão da Copa do Brasil). A competição é realizada por meio de pontos corridos desde 2003, ou seja, jogam todos contra todos, em jogos de ida e volta, e o campeão é quem faz mais pontos após 38 rodadas.

A fórmula de pontos corridos do campeonato não é um consenso entre profissionais da bola. Os críticos argumentam que, para vencer o campeonato, é necessário realizar pesados investimentos, é preciso ter dinheiro, grande elenco de jogadores e uma gestão consistente, o que privilegia os times com melhor capacidade financeira e de gestão.

Para os críticos, se o Campeonato Brasileiro de Futebol fosse estruturado no formato “mata-mata”, ou seja, torneio eliminatório (como a Copa do Brasil), o campeonato seria mais justo, pois permitiria que o imponderável auxiliasse os times menores, na medida que exigiria um planejamento jogo-a-jogo. Dentro desta linha, a CBF vem aumentando a premiação da Copa do Brasil em detrimento do Brasileirão Série A.

A gestão do futebol, em grandes linhas, reflete o desprezo que um grande número de brasileiros ainda tem pelas boas práticas de gestão, em especial pelo planejamento. Tal comportamento pode ser constatado em vários segmentos da sociedade: empresários que operam suas empresas sem planejar o fluxo de caixa; famílias que não administram os orçamentos; investidores que não planejam suas necessidades de liquidez; o setor público, que consegue comprar testes para a Covid-19, mas não consegue distribuí-los antes que o prazo de validade expire; bem como alunos que querem escrever seu trabalho de conclusão de curso na véspera da entrega, mesmo tendo seis meses para fazê-lo. Tais comportamentos sinalizam que a principal prática de gestão no Brasil é apostar na possibilidade de salvar-se cotidianamente com um pênalti favorável marcado no último minuto do jogo.

O imponderável pode ajudar em alguns momentos, mas a geração de resultados consistentes no longo prazo, na grande parte das atividades, é resultado de um planejamento realista e bem formulado, de uma execução competente dos planos, de controles eficazes dos desvios entre o planejado e o executado e de um ágil sistema de correção de rumos, pois como diria Senêca, “não existe vento favorável para quem não sabe onde deseja ir”.

Os próximos meses deverão exigir enorme capacidade de gestão no Brasil, pois será necessário montar um plano para administrar a segunda onda da Covid-19 e suas consequências sobre o sistema de saúde e o sistema econômico. Além disso, a proximidade da vacina exigirá muito planejamento, pois é preciso definir qual vacina que será comprada; quem irá comprar e quem irá recebê-la; onde, como, quando e quem irá aplicá-la; quanto custará; e, por fim, como será o financiamento, pois, ao contrário da chegada da Covid-19, que não permitiu um planejamento com a antecedência, o processo de vacinação tem tempo hábil para ser planejado.

Com os resultados do pleito eleitoral das capitais, o governo precisa equacionar seu planejamento orçamentário para 2021, sinalizando quais as intenções em termos fiscais, pois esta variável será o grande indicador para as projeções de crescimento do PIB, para os juros, câmbio e inflação.

Não parece razoável acreditar que, como no torneio de futebol, o imponderável resolverá a situação. Na Copa do Mundo de 2014, acreditamos que o imponderável poderia salvar a “pátria no futebol”, mas a Alemanha mostrou que, mesmo em um torneio eliminatório, o bom planejamento não dá espaço ao imponderável.

O mês de novembro se encaminha para o fim com o mercado de ações monitorando o andamento das questões fiscais, mas muito animado com as boas notícias relacionadas à política americana, com o Presidente Trump preparando a transição, bem como com à previsão da chegada da vacina, o que continuou irrigando o mercado com um forte fluxo de investidores estrangeiros.

O IBOVESPA fechou a semana em 110.575 pontos, se aproximando dos 113.681 pontos do dia 21 de fevereiro (véspera da crise Covid-19), com valorização de 4,27% na semana e de 17,69% no mês, enquanto o dólar ptax fechou em R$ 5,3494, com uma queda de 0,02% na semana e de 7,32% no mês.

O mercado de renda fixa continua com as preocupações voltadas para as questões inflacionárias e fiscais. As taxas de contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) mais curtas, para janeiro de 2022, que refletem expectativas mais imediatas para a Selic, apresentaram pequena queda de 3,31% para 3,25%, enquanto as mais longas, que refletem os riscos fiscais, para janeiro de 2027, recuaram de 7,60% para 7,49%, refletindo as indefinições fiscais.

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¹ Disponível em: https://conteudo.cbf.com.br/cdn/201912/20191213172843_346.pdf Estudo divulgado em dezembro de 2019.

 

(*) Professor do DCCA da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS, Doutor em Administração, com ênfase em Finanças e Mestre em Economia pela UFRGS.