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Entrevista: Momento pede tranquilidade e prudência na tomada de decisões

16 de abril de 2020

Diante da situação de alta volatilidade do mercado provocada pela crise do novo coronavírus (COVID-19), as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) e autoridades do segmento devem fazer um exercício de pensar em medidas para amenizar os impactos, principalmente, nos investimentos. Contudo, por ter uma característica de longo prazo, as decisões devem ser tomadas com cautela. “Estamos nos deparando com uma situação mundialmente atípica e isso tem exigido de toda a sociedade e todos os países um processo intenso de adaptação e compreensão. A tendência é que seja um aprendizado coletivo muito grande. Um processo dessa natureza exige um grau grande de serenidade para que não haja adoção de nenhuma medida extrema, mantendo a devida tranquilidade e prudência na tomada de decisões”, diz José Roberto ferreira, Sócio-Diretor na Rodarte Nogueira & Ferreira, consultoria em atuária e estratégia.

Em entrevista ao blog Abrapp em Foco, Ferreira destacou que tanto as entidades quanto o Estado, por meio da fiscalização, devem ter cuidado com os próximos movimentos. “A própria entidade, pelos compromissos e o dever fiduciário que os administradores detêm, têm uma preocupação muito grande relacionada aos investimentos, e um compromisso contratado junto aos participantes e assistidos por intermédio dos planos. A preocupação é entregar os resultados que fundamentam as expectativas desse público”, destaca. Para ele, qualquer movimento abrupto e de muita intensidade em situações atípicas ou de muita volatilidade carrega um risco desproporcional aos resultados potenciais. “Não é de prudência grande movimentação ou reposicionamento aproveitando oportunidades teóricas, pois isso decorre de um quadro anormal”. Leia a entrevista completa com José Roberto Ferreira:

Longo prazo

O consultor da Rodarte Nogueira & Ferreira reforça que é necessário manter prudência nos movimentos relacionados a investimentos para que não se use de uma oportunidade teórica, podendo decorrer em uma perda muito mais significativa. “O grande sustentáculo dessa medida mais prudente é a natureza das entidades. O sistema tem uma situação particularmente privilegiada. Nossos dirigentes possuem diligência ao estruturar portfólios de longo prazo, buscando comprometer, na aquisição de ativos, prazos relacionados ao passivo. A questão de liquidez que faria realização de ativos está considerada nesses prazos. Portanto, essas ações podem gerar um impacto contábil, mas não financeiro”, destaca Ferreira. “Posições cujo preço de mercado reflete uma instabilidade podem sofrer impacto, mas não correspondem a uma perda patrimonial sob aspecto financeiro, exceto no caso de realização de ativos, que deve ocorrer pontualmente”, complementa.

Políticas de investimento

“Todas as entidades aprenderam que, ao iniciar uma política de investimento, a sua referência não é o mercado financeiro, e sim o passivo de seu plano”, ressalta José Roberto Ferreira. Ele destaca que a partir do passivo, pode-se compreender duas métricas: prazo e preço, que são as taxas necessárias para fazer frente aos compromisso assumidos com o participante. “A política para orientar aquisição de ativos e composição de portfólio já é pensada dessa maneira. Se isso acontece e está pautado no médio e longo prazo, uma aquisição de ativos com essa característica faz com que uma situação como a atual limite os efeitos econômicos, mas não financeiros. Em algum momento, a recuperação virá, pois a economia retomará seu rumo”, reforça.

Perfis de investimento

Ferreira destaca que toda entidade que tiver condição de manter sua política de investimento sob aspecto da expectativa de prazo e preço, revendo apenas sobre um fator de agravamento de seus compromissos em face à situação de mercado, tem tudo para superar esse período de crise de forma serena. “O que ocorre é uma pressão grande e preocupação intensiva de participantes e assistidos quando começam a observar os resultados. Essa sensação vem com força e acaba pressionando os gestores das entidades a eventualmente atenderem alguma medida”. Para ele, a questão do perfil de investimento tem intenção e modelagem positiva, mas é um esforço compartilhado entre entidade e a escolha do participante. “Às vezes o perfil é utilizado pra ter uma performance melhorada ou mais contida levando em consideração os resultados do mercado. A variável é o tempo, e o objetivo é que isso não resulte em perda financeira, já que o propósito das EFPC é prover renda no longo prazo”.

Natureza previdenciária

Nesse momento de pressão, José Roberto Ferreira defende o resgate da vocação que justifica a existência de uma EFPC. “Essa é uma bandeira frente à pressão sobre os resultados”. Ele ressalta que pela natureza e expertise das entidades de prover renda, em geral, no período pós-laboral, o assunto investimento não é o primário. “É um assunto muito importante, fundamental, mas é secundário. A parte previdenciária às vezes fica relegada”, destaca.

Fiscalização e regulação

“Tenho acompanhado o esforço da fiscalização e regulação, e o Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), com muito apoio da Abrapp e da Anapar, busca agendas e pautas que possam trazer para o sistema uma contribuição para superação desse momento”, destaca Ferreira. Para ele, há uma série de desafios e necessidades que são atinentes e acabam alcançando as EFPC sob seu aspecto social. “Num processo como esse que o país atravessa, a proteção desta fonte primária de renda aos assistidos é fundamental. Claro que essa discussão precisa de cautela”, ressalta. Ele defende que qualquer medida que tange suspensão de contribuições extraordinárias, que são direcionadas a equacionamentos de déficit, devem ser bem pensadas pelo prazo que podem alcançar para não gerar insolvência. “Ações dessa natureza devem ser sustentadas com a preservação da solvência, e com os esforços de todo o estado e sociedade civil na adoção de métricas. Não há uma prescrição única aplicável a todos os planos, pois eles são diferentes entre si, mas havendo condições tecnicamente sustentáveis de suspender, ainda que por um período curto, eventuais contribuições, sem que isso afete a saúde sob aspecto de solvência e liquidez, pode ser um fator positivo”, complementa.

As contribuições normais tem outro desafio, segundo Ferreira, pois alcançam as patrocinadoras. “O impacto no que diz respeito ao fluxo contributivo para entidades pode ser intensificado”. Na sua visão, outros caminhos podem ser percorridos primeiramente, como a repactuação de empréstimos, antes de se chegar nessa medida. “Uma repactuação que possa gerar a redução dos pagamentos da prestações, ou até mesmo uma suspensão das parcelas desse empréstimos, sejam imobiliários ou simples, caso a liquidez do plano permita. As entidades possuem grande volume desses empréstimos. Ao esgotar as possibilidades de repactuação, suspensão de pagamentos, revisão dos parâmetros de remuneração dos empréstimos, e trabalhando com uma taxa mais ajustada, a suspensão de contribuições podem ser uma medida última como forma de preservar a normalidade de fluxos previstos aos planos”, ressalta.

Oportunidades

“Sendo realista, a situação atual traz oportunidades”, avalia Ferreira. “Em um momento como este, se estabelece uma revisão da organização funcional de uma entidade de previdência na qual se passa a conviver com a figura do teletrabalho, o que é uma grande oportunidade, embora seja decorrente de uma situação triste. A entidade, conseguindo ter êxito no desenho de organização via teletrabalho – e muitas estão conseguindo manter quase a normalidade do funcionamento com o trabalho remoto –, pode resultar em um ganho para todos”. Ferreira destaca que além dos empregados passarem a dispor de mais tempo junto a família e menos preocupação com despesas, as EFPC, a partir do momento que não têm a necessidade de presença física das pessoas, podem resolver questões como espaço físico. “As entidades podem reduzir drasticamente suas despesas com locação, acompanhado de outras reduções, como despesas de auxílio transporte e alimentação, se couber. O quanto antes entidades compreenderem que esse pode ser um modelo de funcionamento eficaz, isso pode facilitar o período de adaptação e transição, resultando no fortalecimento coletivo”.

Fonte: Plantão ABRAPP em foco

https://www.blogabrapp.org/post/entrevista-momento-pede-tranquilidade-e-prud%C3%AAncia-na-tomada-de-decis%C3%B5es?postId=5e977a4e8019ae002df8e075